A nossa infância...

Para quem não sabe, o Tamagotchi é o brinquedo típico da infância da geração que nasceu entre 1985 e 1990. No início o conceito parecia genial, ora ali estava um animal de estimação que não iria dar trabalho nenhum aos pais. Sim, o principal problema dos cães e gatos como animais de estimação para crianças é que as crianças ficam com o lado divertido (brincar com eles e dar-lhes carinho) e os pais com o lado aborrecido (passeá-los, limpá-los, alimentá-los...). Com o Tamagotchi tudo isso iria mudar, a única coisa que os pais tinham de fazer era desembolsar 5000$ e as crianças ficariam felizes e os pais teriam tempo livre.
Lembro-me que fiquei baralhado na primeira vez que ouvi falar neste brinquedo, nessa altura ele tinha apenas chegado ao Japão. Foi-me dito que era preciso alimentá-lo, lavá-lo e dar-lhe vacinas. Na minha mente de 9 anos imaginei-me a enfiar carcaças e vegetais para dentro de uma máquina ou a passar a dita por baixo do chuveiro. E aquilo ficou na minha cabeça por mais de um ano, até que o dito "bicho" chegou finalmente a Portugal. Nessa altura fez-se luz na minha cabeça "Ah! Eu para o alimentar só tenho de carregar nos botões!". E pronto, chegou então o dia de que falava há pouco e no qual eu fui comprar este brinquedo.
Nos primeiros dias tudo foi um mar de rosas. Ou quase... Aquela bolinha andava ali, feliz no ecrã, eu dava-lhe uns bolinhos, passava-o por água e desligava a luz para ele ir dormir, no entanto havia um problema. Para quem viveu aquela altura deve lembrar-se que para aí 30% destas máquinas eram produzidas na Indonésia. Eu tive o azar de comprar uma que tinha sido lá feita. Eu tinha apenas 10 anos, não fazia qualquer ideia do que era a política, quanto mais o "embargo" português a este país. E pronto, fui gozado até ao dia em que colei um autocolante com o meu nome por cima das palavras "Made in Indonesia". A partir desse dia, sim, fui feliz.
Passados uns 3 dias ele cresceu, tornou-se numa bola maior. Tudo parecia correr bem. Parecia, até à aula de Educação Física em que no final, quando eu me dirigi para o balneário e olhei para a máquina vi que ele tinha feito dois "cócós" e já estava lá no cantinho um símbolo de uma caveira indicando que ele estava doente. Foi aí que começaram as dúvidas. "Então eu abandono-o 50 minutos e este sacana ia-se matando? Eu tenho de estudar, não posso estar sempre a dar-lhe atenção... Ele que não pense que vai ser um Tamagotchi mimado...". E pronto, foi o fim... Ainda assim, limpei-o e dei-lhe a vacina. No dia seguinte ele voltou a evoluir e enquanto todos os outros Tamagotchi tinham, neste estado de evolução, um aspecto saudável, o meu parecia um fumador de 90 anos que havia começado a fumar 3 maços por dia desde os seus 13 anos. Era hediondo e eu comecei lentamente a tentar abandoná-lo.
Com toda esta febre deixou de nos ser permitido andar com os bonecos na hora de almoço e o meu lá ficou, abandonado debaixo do tampo da carteira. Depois de almoço, quando esperava vir dar-lhe carinho, abri o tampo da mesa e... Ele não estava lá, alguém o havia roubado. Fiquei triste, derramei uma lágrima e gritei um sonoro "NÃOOOooo...". Esse foi um dos dias mais tristes da minha vida, o mais triste foi quando descobri que o radar do aeroporto tinha um motor e não se movia apenas com a força do vento. Na noite em que perdi o Tamagotchi dormi mal, mas no dia seguinte acordei e sentia-me um homem novo. Sentia-me livre. Foi aí que percebi "Nunca mais quero ter um animal de estimação...".
P.S. - Ainda hoje tenho algumas dúvidas... Que bicho era aquele? E o que acontecia no final? Alguma vez alguém chegou ao final?
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